terça-feira, 9 de setembro de 2008

SPED Contábil & Entidades Sem Fins Lucrativos

 

Durante o 18o Congresso Brasileiro de Contabilidade uma profissional da área me procurou com algumas dúvidas sobre a Escrituração Contábil Digital - ECD. Faço questão de ressaltar que as questões são muito pertinentes e, pelo que apurei, de respostas não muito simples. Aliás, enviei-as para vários colegas e, até o momento, apenas Paulo José dos Santos, consultor da Mastersaf, me enviou resposta.

As questões

"Trabalho em entidade sem fins lucrativos(educacional). Não sendo uma sociedade empresária, seus atos constitutivos, alterações e atas não estão sujeitos ao registro pela Junta Comercial e sim pelo Registro de títulos e documentos pessoa jurídica. Recebemos notificação da Receita Federal informando que nossa entidade foi inclusa no Programa de acompanhamento econômico-tributário diferenciado das pessoas jurídicas e por esta razão os níveis de arrecadação de tributos federais por parte da entidade teriam acompanhamento mensal. A mesma notificação lembra que, nos termos da IN RFB n° 787/2007, a entidade deverá apresentar a escrituração contábil digital em relação aos fatos contábeis ocorridos a partir de 1° de janeiro de 2008.

Questionamentos:

a) Pela simples leitura, verifica-se que a  IN 787/2007 determina que empresas tributadas pelo lucro real estariam sujeitas à escrituração digital. Pode a Receita Federal exigir que as entidades imunes também cumpram com tal dispositivo, só pelo fato de estarem inclusas no Programa de acompanhamento econômico-tributário diferenciado? Há respaldo legal para esta exigência?

b) Em havendo amparo legal para tal exigência e sendo a autenticação dos livros uma das etapas para a entrega dos livros contábeis em meio digital, qual base legal prevê que os Registradores de títulos e documentos também devem se adequar, de forma a possibilitarem que as entidades sem fins lucrativos(simples) enviem os livros na forma digital para a receita Federal e estes estejam autenticados?

c) No site da Receita Federal, quando se explica como funciona o SPED, fica bem claro que as Juntas Comerciais precisam autenticar os livros em meio digital, mas com relação aos demais registradores, nada consta? A entidade(a nível nacional) que congrega todos estes registradores de títulos e documentos, está orientando-os neste sentido? De que forma?

d) No município de Novo Hamburgo-RS o titular do Registro de títulos e documentos e pessoas jurídicas é Valter da Cunha Pinheiro. Falei com a escrevente substituta e esta informou que não estavam ao par da necessidade de adequação."

O contexto legal do SPED Contábil

"A obrigatoriedade de participação no SPED Contábil é definida pela IN787 de 19/11/07.

'Instrução Normativa RFB nº 787, de 19 de novembro de 2007

(...)

Art. 3º Ficam obrigadas a adotar a ECD, nos termos do art. 2º do

Decreto nº 6.022, de 2007:

I - em relação aos fatos contábeis ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2008, as pessoas jurídicas sujeitas a acompanhamento econômico-tributário diferenciado, nos termos da Portaria RFB nº 11.211, de 7 de novembro de 2007, e sujeitas à tributação do imposto de renda com base no lucro real;

II - em relação aos fatos contábeis ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2009, as demais pessoas jurídicas sujeitas à tributação do Imposto de Renda com base no Lucro Real.

(...)'

Na prática, a Coordenação Especial de Acompanhamento dos Maiores Contribuintes (Comac) indica empresas que devem “participar” do acompanhamento diferenciado com base em alguns critérios, conforme abaixo.

'Portaria RFB nº 11.211, de 7 de novembro de 2007(*)

DOU de 12.11.2007

Dispõe sobre o acompanhamento econômico-tributário diferenciado das pessoas jurídicas.Alterada pela Portaria RFB n° 11.365, de 12 de dezembro de 2007.Anexo Único Retificado no DOU de 28/12/2007, Seção 1, pág. 52.

(...)

Art. 4º As pessoas jurídicas objeto do acompanhamento diferenciado serão indicadas pela Coordenação Especial de Acompanhamento dos Maiores Contribuintes (Comac), com base nas seguintes variáveis:

I - receita bruta constante da Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ) ou dos Demonstrativos de Apuração de Contribuições Sociais (DACON);

II - débitos declarados nas Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF);

III – massa salarial constante das Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP);

IV - débitos totais declarados nas Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP);

V - representatividade na arrecadação de tributos administrados pela RFB.

§ 1º Além das indicações procedidas nos termos do caput, poderão ser objeto de acompanhamento diferenciado, por iniciativa da Comac, as pessoas jurídicas:

I – de direito público;

II – que operem em setores econômicos relevantes, em termos de representatividade da arrecadação tributária federal;

III – que tenham efetuado indevidamente compensações de tributos, nos termos do art. 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996;

IV – imunes, isentas ou beneficiárias de incentivos fiscais; e

V – que tenham praticado infrações à legislação tributária, apuradas em procedimentos de fiscalização efetuados no âmbito da RFB.

(...)'

A resposta de Paulo José dos Santos, da Mastersaf.

Entendo que sim, o assunto é controverso,não encontrei respaldo legal que ampare esta exigência do Fisco federal,mas a imunidade,pelo que me lembro,é uma previsão constitucional,nem a IN.787/07 e nem o Decreto 6.022/07,se manifestam em relação as entidades imunes,dessa forma entendo que seria devida a exigência do ECD,por esse aspecto, sem entrar no mérito da
inconstitucionalidade.

Tanto a IN.787/07 quanto o Decreto 6.022/2007,não normatizam nada a respeito' dos 'Registradores de Títulos , mas a Lei 9.532/97 em seu artigo 12 estabelece disposições a respeito da obrigatoriedade da escrituração contábil, conforme disposto abaixo.Dessa forma entendo que a empresas com acompanhamento econômico-tributário diferenciado deverão atender as
disposições do ECD.

As entidades sem fins lucrativos (imunes ou isentas) estão obrigadas a escrituração contábil completa posto que a falta desta acarreta a perda da condição conforme observado nos artigos 12º á 15 da Lei 9532/97, conforme abaixo.

"Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.

§ 1º Não estão abrangidos pela imunidade os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.
§ 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:
a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados;
b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;
c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão;
d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial;
e) apresentar, anualmente, Declaração de Rendimentos, em conformidade com o disposto em ato da Secretaria da Receita Federal;
f) recolher os tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados e a contribuição para a seguridade social relativa aos
empregados, bem assim cumprir as obrigações acessórias daí decorrentes;
g) assegurar a destinação de seu patrimônio a outra instituição que atenda às condições para gozo da imunidade, no caso de incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de suas atividades, ou a órgão público.
h) outros requisitos, estabelecidos em lei específica, relacionados com o funcionamento das entidades a que se refere este artigo.
§ 3° Considera-se entidade sem fins lucrativos a que não apresente superávit em suas contas ou, caso o apresente em determinado exercício, destine referido resultado, integralmente, à manutenção e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais. (Redação dada pela Lei nº 9.718, de 1998)

Art. 13. Sem prejuízo das demais penalidades previstas na lei, a Secretaria da Receita Federal suspenderá o gozo da imunidade a que se refere o artigo anterior, relativamente aos anos-calendários em que a pessoa jurídica houver praticado ou, por qualquer forma, houver contribuído para a prática de ato que constitua infração a dispositivo da legislação tributária, especialmente no caso de informar ou declarar falsamente, omitir ou simular o recebimento
de doações em bens ou em dinheiro, ou de qualquer forma cooperar para que terceiro sonegue tributos ou pratique ilícitos fiscais.
Parágrafo único. Considera-se, também, infração a dispositivo da legislação tributária o pagamento, pela instituição imune, em favor de seus associados ou dirigentes, ou, ainda, em favor de sócios, acionistas ou dirigentes de pessoa jurídica a ela associada por qualquer forma, de despesas consideradas indedutíveis na determinação da base de cálculo do imposto sobre a renda ou da contribuição social sobre o lucro líquido.

Art. 14. À suspensão do gozo da imunidade aplica-se o disposto no art. 32 da Lei n.º 9.430, de 1996.

Art. 15. Consideram-se isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos.

§ 1º A isenção a que se refere este artigo aplica-se, exclusivamente, em relação ao imposto de renda da pessoa jurídica e à contribuição social sobre o lucro líquido, observado o disposto no parágrafo subseqüente.
§ 2º Não estão abrangidos pela isenção do imposto de renda os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.
§ 3º Às instituições isentas aplicam-se as disposições do art. 12, § 2°,
alíneas "a" a "e" e § 3° e dos arts. 13 e 14."

O DNRC seria o órgão responsável,mas não há nenhuma orientação por parte desse órgão em relação a como proceder.
Considerações:
1)    Receita Federal notificou a empresa exigindo a escrituração digital;
2)    Não há orientação nas normas do Sped e ECD,em relação a empresas imunes quanto a escrituração digital;
3)    A imunidade é um direito constitucional;
4)    A autenticação dos livros é norteada pelos cartórios de títulos e nãopela junta comercial;
5)    A Lei 9.532/97 estabelece que as empresas imunes também estão obrigadas  a escrituração contábil;
6)    O Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC) é o órgão responsável pelo registro de empresas mercantis.
7)    A obrigatoriedade dos livros compreenderá,livro Diário e seus
auxiliares, se houver,livro Razão e seus auxiliares, se houver,livro
Balancetes Diários, Balanços e fichas de lançamento comprobatórias dos assentamentos neles transcritos,não compreende  'Registradores de Título e Documentos'.


Diante dessas considerações,sob pena de perder sua condição de empresa imune,entendo que a empresa deve atender a exigência da Receita federal,indagando por escrito, se for o caso,como proceder no atendimento da notificação,no tocante a escrituração digital,uma vez que,não foi expedida nenhuma norma específica em relação a tratativa para Registradores de Títulos e outros documentos.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bom Dia, com a leitura feita, posso visualizar um pequeno detalhe. O decreto nº. 6.022 de 2007, em seu insiso I fala que estão sujheitos a ECD as pessoas juridicas sujeitas a acompanhamento economico-tributário diferenciado E sujeitas ao lucro real. Como a empresa é ESFL, faz parte do Terceiro Setor, não é do lucro Real, é uma empresa Isenta, então não presica ECD, somente acompanhamento diferenciado, porem os livros são normais, como de constume, autenticados no Car´torio de Titulos e Documentos. Penso que foi pelo fato da forma de escrituração diferenciado, que foi restringido só as empresas do lucro Real o ECD.

Roberto Dias Duarte disse...

Veja a resposta oficial da RFB em:
http://robertodiasduarte.blogspot.com/2008/09/ecd-entidades-imunesisentas-ii.html