domingo, 2 de novembro de 2008

Entrevista com Roberto Dias Duarte, por Alexander de Araújo Lima

O  aluno de Ciências Contábeis da Faculdades São José - Rio de Janeiro - RJ, Alexander de Araujo Lima, que acompanha meu blog desde de o início, me enviou as questões abaixo para subsidiá-lo em sua monografia.

1) A implantação do SPED, em especial da NF-e, desencadeou uma verdadeira revolução na gestão empresarial brasileira, agregando vantagens para as organizações, mas também para o fisco, que aumentou sua presença fiscal e para o governo, que incrementou sua arrecadação. Esta hipótese realmente é procedente? Quem realmente vai sair ganhando com o SPED?

Em opinião, o SPED é um projeto de inclusão da inteligência fiscal brasileira na Era do Conhecimento. Em outras palavras, as autoridades fiscais, em todos os níveis estão usando a tecnologia da informação para fornecimento de informações com velocidade e precisão, capacitando seus profissionais para analisarem tais informações em busca de indícios de fraude ou sonegação. Esse movimento gera, necessariamente, uma demanda, por parte das empresas, de também se incluírem na Sociedade do Conhecimento.

Claro que, aumentando a presença fiscal, de forma eletrônica, a margem de manobra para fraude e/ou sonegação diminui, e a arrecadação tende a aumentar.

Quem ganha com isso, em primeiro lugar é a nação, pois a concorrência desleal, a pirataria, contrabando, e empresas “predadoras” que se consideram “acima da lei”, certamente terão problemas.

Empresas sérias, no meu entendimento, devem encarar o SPED não como um projeto da área fiscal ou contábil, mas como uma forma de melhoria de todo o processo gerencial e logístico. Já vi depoimentos de grandes empresas confirmando esse ponto de vista. E, para provar que pequenos negócios podem ter ganhos reais, eu mesmo incluí voluntariamente a editora que criei no processo de emissão de NF-e. Obtive uma redução de custos logísticos na ordem de 95%.

Penso está se abrindo uma imensa janela de oportunidades para contadores que poderão prestar serviços de alto valor agregado aos seus clientes como: planejamento tributário, auditoria e contabilidade gerencial.

2) De que maneira o novo profissional de contabilidade vai se inserir nesta nova perspectiva? Quais mudanças devem ocorrer no perfil dos atuais profissionais contabilistas para se adaptar a nova era?

Com a massificação do uso da NF-e, muitas tarefas tenderão a desaparecer devido à integração da cadeia produtiva do ponto de vista fiscal. A digitação e conferência de documentos fiscais devem ser reduzidas significativamente.

Por outro lado, não vejo como as empresas funcionarem sem planejamento tributário, auditoria e contabilidade gerencial.

Além disso, o contador poderá apoiar as empresas no processo de seleção e implantação de ERP’s, softwares para gestão empresarial.

Entretanto, algumas habilidades são imprescindíveis para os profissionais da Era do Conhecimento:

Habilidade com o uso da tecnologia: uma pessoa hábil no uso da tecnologia consegue obter informações com mais velocidade e precisão.

Habilidades de análise e síntese das informações: somente essas habilidades humanas são capazes de gerar conhecimento a partir da informação.

Habilidade de comunicação: a logística de entrega do conhecimento se dá através da comunicação.

3) Já é possível vislumbrar o comportamento das organizações diante da implantação integral do SPED? Temos subsídios para mensurar as economias com a redução dos custos com impressão, armazenamento e emissão nas notas fiscais em papel, bem como da simplificação dos procedimentos contábeis e fiscais?

Os principais impactos para as organizações a meu ver são os seguintes:

a) Profissionalização das atividades gerenciais e operacionais.

b) Planejamento tributário

c) Organização de processos contábeis

d) Revisão de processos, em especial administrativos e logísticos

e) Auditoria

f) Integração eletrônica de informações fiscais e logísticas com clientes, fornecedores e contadores.

g) Capacitação profissional

h) Implantação de sistemas de apoio a gestão empresarial (ERP).

i) Segurança da informação.

Como disse, há muitos casos de sucesso de empresas grandes que obtiveram ganhos significativos, mas eu prefiro citar meu caso por se tratar de uma empresa muito pequena.

A Ideas@Work é uma editora e distribuidora do meu livro. Não tem funcionários e seus serviços contábeis são terceirizados.

Para vender um livro, recebo a encomenda por e-mail e envio por carta registrada, em geral. Antes da implantação da NF-e, solicitava ao meu contador o envio da nota fiscal tradicional por carta registrada também. Tinha o custo de R$2,00 por nota emitida mais R$5,60 de despacho do documento pelo correio.

Hoje com a NF-e, tenho o custo de apenas R$0,60 por NF-e emitida, sendo que eu envio o DANFE, em alguns casos, para o cliente antes mesmo de despachar a mercadoria. Assim ele pode conferir o pedido.

No meu caso, o custo de armazenamento da nota em papel era pequeno, mas o de recuperação de documentos antigos era alto. Afinal eu não tenho um estagiário para trancar no depósito para procurar uma nota de3 anos atrás. Eu mesmo gastava horas procurando um documento.

4) Nosso país possui excelente reputação no tocante a implantação de sistemas tecnológicos de informação, por exemplo, no processo eleitoral, nas transações bancárias e na entrega de declarações de imposto de renda, entre outros. O SPED é mais uma novidade neste campo. Qual a posição do Brasil em comparação a outros países no que diz respeito a este tipo de tecnologia de informação a serviço das organizações, fisco e arrecadação tributária?

Não conheço profundamente o modelo de NF-e do Chile e do México, nem o de Fatura Eletrônica da União Européia. Portanto, prefiro não arriscar uma análise superficial.

5) Ao emitir uma NF-e em menos de 1 minuto foi verificada a regularidade fiscal das partes e retornada a autorização para circulação das mercadorias, numa operação simples, rápida, segura, com pouco custo, com mínima intervenção humana. Como mensurar todas essas vantagens, comparativamente, em relação à emissão de notas fiscais em papel?

Essa eu já respondi na questão 3. Basicamente os ganhos são na emissão, guarda e recuperação do documento fiscal eletrônico. Além dos ganhos logísticos fiscais e administrativos decorrentes da integração da cadeia produtiva.

6) Quais os resultados preliminares em relação à implantação parcial do SPED, tanto para o governo quanto para as empresas?

Com relação as empresas, os ganhos foram respondidos nas questões anteriores.

Para o governo, ainda não vi nenhum dado oficial, mas há artigos publicados pela imprensa que retratam um aumento de arrecadação de até 10% em alguns estados em função da implantação da NF-e.

7) Qual o próximo passo? Que novidades ainda terão no campo da tecnologia da informação voltada para área contábil, fiscal e administrativa, ou seja, na gestão empresarial como um todo?

Do ponto de vista do projeto SPED ainda há um longo caminho:

a) Massificação da NF-e, ECD, EFD, NFS-e e do Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-e)

b) Implantação do e-Lalur, e-Folha, e outros livros fiscais

c) Eliminação das obrigações acessórias tradicionais

Do ponto de vista empresarial, um grande desafio é a capacitação das pessoas, além dos que já citei anteriormente.

8) Por fim, o SPED, a NF-e, ECD e EFD, representam o que há de mais avançado em tecnologia de informação voltado para a gestão contábil e fiscal, do ponto de vista do governo e das empresas. Contudo, vivemos num manicômio fiscal? Conforme alguns autores quando se referem a nossa confusa legislação tributária, tão complicada que chega a confundir até os gestores, profissionais que lidam com ela diariamente. Qual a importância de um planejamento tributário e qual o papel do profissional da era do conhecimento neste contexto, em especial os contabilistas?

Segundo estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, IBPT, temos uma alteração em normas tributárias a cada duas horas. Realmente há muita gente normatizando a questão: câmaras municipais, assembléias legislativas estaduais, o congresso nacional e uma infinidade de entidades responsáveis pela matéria. Há ainda o caráter subjetivo de cada norma, cabendo a cada profissional que faz cumprir as regras, sua própria interpretação.

Isso tudo cria cotidianamente fatos surreais na vida das empresas. Não conheço um só empresário que não tenha passado por uma situação tributária “estranha”.

O SPED tende a minimizar um pouco desse problema. Contudo, em minha opinião, nem meus netos verão alguma mudança significativa na nossa realidade tributária kafkaniana. Nossa cultura valoriza por demais a forma e pouco o conteúdo. Somos pouco pragmáticos quando o assunto é direito. Sempre achamos que novas normas resolverão todos os problemas.

O planejamento tributário tem se tornado cada vez mais imprescindível para empresas de todos os portes. O SPED tende a reforçar esse ponto. Planejamento significa olhar para frente, projetar o futuro, e traçar a rota, o caminho que você pretende percorrer.

Minha visão sobre planejamento tributário é bem pragmática. O trabalho que o antecede é o planejamento empresarial. Sem saber quanto pretendo vender, o que pretendo vender e onde, além dos principais custos, o planejamento tributário é uma peça de ficção.

O que vejo em muitas empresas é “reprogramação tributária”. Uma anomalia jurídica e gerencial onde o empresário “escolhe, com a conivência de seu contador, o enquadramento tributário que aparentemente parece ser de menor custo. Ao longo do exercício fiscal, ele utiliza de mecanismos “estranhos” à legislação (em geral a manipulação de dados de faturamento, compras e contábeis) ou de ações judiciais para reduzir sua carga tributária.

A meu ver o SPED-colocará um fim nessa orgia fiscal/contábil.

Portanto, gestores e contadores precisarão das habilidades básicas para sobrevivência na Era do Conhecimento: habilidade com tecnologia da informação, análise, síntese e comunicação.

2 comentários:

Alex disse...

Roberto, Muito obrigado pelo carinho e pela atenção!!
è difícil encontrar alguém com uma agenda tão conturbada prestar essa atenção para com os leitores.
Um forte abraço.

Alexander de Araujo

Consultora Empresarial disse...

Parabéns pelo trabalho Roberto,acredito que o desafio está lançado, é o momento de nos valorizarmos. Estou começando como empresária contábil, depois de 20 anos dentro de empresas, mas enxergo uma oportunidade ímpar para fazer a diferença neste mercado, e este tipo de trabalho como o seu nos motiva muito.
Um abraço,

Andréa Brandão(bebcontabil.com.br)